Responsável pela morte de 704.897 pessoas no Brasil, a covid-19 tem se tornado cada vez mais rara na rotina dos hospitais. Quando detectada, apresenta sintomas leves — como se fosse uma gripe ou um resfriado — e é, na maioria dos casos, incapaz de levar pacientes sem comorbidades a quadros graves ou óbito. Essa é a percepção relatada por médicos a GZH quando questionados sobre o cenário atual da doença no Rio Grande do Sul.
A vivência dos profissionais da saúde nos últimos meses é também notada nos dados da covid-19 neste ano: o Estado registrou queda de 77,9% nas mortes em 2023 na comparação com 2022.
Entre 1º de janeiro e 11 de agosto deste ano, 920 pessoas morreram em decorrência da doença no Estado; no mesmo período de 2022 foram 4.172. Os dados são do Ministério da Saúde (MS) e foram analisados pela reportagem. Desde 2020, 42.440 morreram por causa da infecção no Estado.
A data de 11 de agosto foi utilizada porque é a última atualização dos casos de coronavírus pelo Ministério da Saúde. Novo Tiradentes, no norte do Estado, é um dos 12 municípios sem mortes em decorrência da doença até o momento no Brasil, e o único gaúcho nessa situação.
O infográfico abaixo mostra a evolução dos óbitos no RS: janeiro, com 299, é o mês com mais mortes no RS em 2023.
A redução foi ainda maior no cenário nacional: 11.044 óbitos por covid-19 em 2023 contra 61.950, entre 1º de janeiro e 11 de agosto de 2022, diferença de 82,1% na comparação.
Veja a evolução mensal das mortes no país:
— Não temos visto mais casos como antes. Quadro grave, então, é muito raro. A covid é, hoje, mais uma doença que há no hospital, igual a todas as outras. Testamos bastante as pessoas com qualquer sintoma respiratório e, às vezes, detectamos o vírus, mas são casos muito leves — diz Caroline Deutschendorf, infectologista e coordenadora da Comissão de Controle de Infecção do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).
Os óbitos também reduziram nos últimos meses. Segundo Caroline, o Clínicas registrou apenas duas mortes relacionadas à doença neste ano; um caso em março e outro em junho. A redução nos óbitos e casos, porém, não significa que o coronavírus deixará de circular na população gaúcha:
— Eventualmente podemos até ter aumento de casos por conta de novas variantes, mas não deve ser como foi em 2020 e 2021 (auge da pandemia). A vacinação acaba impedindo o avanço da doença. Vamos ver o que chamamos de endemicidade: o vírus circula esporadicamente, com frequência maior em alguns períodos, assim como a influenza (vírus da gripe) — acrescenta a infectologista.
O relato é parecido ao momento vivido na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, segundo o infectologista Dimas Kliemann. A covid-19 passou de uma doença letal entre 2020 e 2021 para uma condição que reduziu de intensidade até se tornar incomum na rotina média. Isso ocorreu também por mudanças do próprio vírus, explica o estudioso:
— Ele (o vírus) precisa dessa adaptação para conseguir se propagar. É uma “inteligência”. Praticamente não existe hoje hospitalização exclusivamente por causa de covid, mas sim de pacientes com outras comorbidades que se infectam, descompensam sua doença de base e precisam ser hospitalizados. Neste ano (2023), eu não presenciei nenhum óbito exclusivamente por covid-19 dentro do hospital.
A exemplo da infectologista do Clínicas, Kliemann também não espera ver o fim do vírus no curto prazo.
— Não esperamos que o covid deixe de circular, pelo menos não imediatamente, não em 2023. Pode ser que isso ocorra no futuro, mas é esperado que em dado momento possa haver surtos localizados, principalmente no começo do ano e nos meses mais frios, de maior confinamento. O cenário atual é muito brando — pontua.
As quedas nos indicadores de casos graves e mortes também influenciam na menor busca por vacinas no Estado. Conforme o painel de monitoramento da imunização covid-19, da Secretaria Estadual da Saúde (SES), há 5,7 milhões de doses em atraso (terceira, quarta e quinta doses). Isso fez com que as autoridades sanitárias acertassem mudar a forma de distribuição dos imunizantes a partir do próximo mês.
— Não há mais necessidade de uma logística de distribuição quinzenal. A vacina (contra a covid-19) passou a ser um imunobiológico de rotina, junto com os demais. Por isso, será distribuída de forma mensal a partir de setembro. Se houver demanda, voltaremos a trabalhar com um espaço de distribuição menor. Hoje, realmente, não há necessidade — explica Tani Ranieri, diretora do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS).
Segundo o Ministério da Saúde, o planejamento da vacinação para 2023 tem como proposta de esquema o uso de vacinas bivalentes com cepas atualizadas com dose de reforço para grupos específicos em maior vulnerabilidade, riscos para complicações e óbito e maior exposição. Já as vacinas monovalentes são destinadas para iniciar ou completar esquema vacinal das pessoas que não fazem parte dos grupos prioritários elegíveis para a vacinação bivalente.
— Quanto mais pessoas estiverem vacinadas, mais proteção coletiva haverá, porque o vírus vai circular com menos intensidade. A propagação será menor pois a possibilidade de formação de novas variantes também está associada à diminuição da incidência (de contaminações) — acrescenta Tani Ranieri.
GZH